Fátima Oliveira

Resumo: O projeto de modernização e Melhoramentos do Rio de Janeiro, capital da República do Brasil, calcado na dinâmica de demolição e de construção de novos prédios e avenidas e de implantação de novas posturas públicas, nas duas primeiras décadas do século XX, resulta em uma tentativa de apagamento de aspectos da memória da cidade colonial e de esgarçamento de vivências e relações afetivas de antigos moradores, guardiões de usos e costumes da tradição. No entanto, a fúria demolidora da burguesia, iniciada em 1903, e os novos repertórios visuais da metrópole carioca, devido aos projetos monumentais republicanos, não intimidaram o escritor Afonso Henriques de Lima Barreto. Atento à evolução da sociedade carioca no tempo, por meio de sua própria experiência como morador da cidade, Lima Barreto conhecia bem a formação social da capital do país e compunha suas críticas, considerando, desde muito jovem, a interação estabelecida entre os processos econômicos, sociais e políticos que se desenrolavam na cidade. É dessa história, no espaço da cidade, que foi sendo construída pelas formações sociais que nela viviam, que as crônicas de Lima se alimentavam e representavam o conjunto de valores do cotidiano citadino, usos e costumes, que se misturam através do tempo. Percorri crônicas e anotações pessoais do autor buscando recolher e cotejar ideias relevantes sobre o desenrolar da tradição e da modernidade, nos subúrbios e nas áreas centrais da cidade, em tempos de Belle Époque. Tempos em que a experiência urbana das elites cariocas se amplifica e moderniza, enquanto as tradições populares se deslocam, em boa parte, para os subúrbios sem perder o caráter de resistência à dominação na cidade que se civiliza.

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